Sunday, October 01, 2006

Uma Mini História do Jazz

Jack Kerouac


“O sax alto estava nas mãos de um luminoso jovem negro, estilo Charlie Parker, um garotão de dezoito anos, bocona escancarada, mas alto que os outros, e grave. Ele ergueu seu sax e gemeu cola e pensativamente, extraindo Frases como pássaros, como se fosse o próprio Bird Parker, e deixando-as suspensas com a lógica arquitetônica de Miles Davis. Era herdeiro dos grandes inovadores do Bop.

Outrora fora Louis Armstrong mandando ver nos lamaçais de Nova Orleans; antes dele, os músicos loucos que entravam nas paradas, aos feriados, e desfaziam as marchas marciais transformando-as em puro ragtime. Então surgiu o swing, e Roy Eldridge, vigoroso e viril, quase explodindo seu trumpete ao arrancar dele sonoras ondas de poder, sutileza, astúcia e requinte lógico – inclinado, com os olhos radiantes e um sorriso encantador, fazendo todo o universo do jazz gingar junto com ele. Então chega a vez de Charlie Parker arrombar a cena: era apenas um garoto morando num casebre de madeira com a mãe em Kansas City, soprando seu sax-alto todo remendado, entre as toras de madeira, praticando somente nos dias de chuva, fugindo vez ou outra para assistir a banda do velho Basie e de Benny Moten, que tinha Hot Lips Page e todo resto – então Charlie Parker se mandou de casa e foi para o Harlem encontrar o louco Thelonious Monk e Gillespie, mais louco ainda – Charlie Parker, que na juventude andava em círculo enquanto tocava. De alguma forma mais moderna, mais inovador de que Lester Young, também nascido em Kansas City, aquele singelo e sombrio bobalhão no qual toda história do jazz está envolta – porque ao erguer seu sax, retilíneo e horizontal, sempre colocado ‘a boca seca e calejada, ele soprava melhor do que qualquer outro; mas à medida que deixava o cabelo crescer ia ficando mais preguiçoso e desleixado, deixando o sax cair à meia altura; até que ele ficou definitivamente apontado para o chão e hoje, calçando seus sapatos de sola largar para não se desgastar nas calçadas dessa vida, Young o sustenta debilmente mantendo-o sempre de encontro ao peito, tocando notas fáceis- e, ainda assim, cool. E eis aqui as crianças da noite bop americana.”

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